18 de novembro de 2011

 

Diálogos com o sociólogo Zygmunt Bauman - IV


O MUNDO PÓS- MODERNO: A CONDIÇÃO DO INDIVÍDUO
Um viciado do facebook me segredou, não segredou de fato, mas gabou-se p-ara mim de que havia feito 500 amigos em um dia. Minhas resposta foi que eu em 86 anos não tinha 500 amigos. Eu não consegui isso. Então, provavelmente quando ele diz “amigo” e eu digo “amigo” não queremos dizer a mesma coisa. São coisas diferentes. Quando eu era jovem, não tive o conceito de “rede”, eu tinha o conceito de laços humanos, de comunidade. Qual a diferença? É que a comunidade precede você. Você nasce numa comunidade. Por outro lado temos a “rede”. O que é uma rede? Ao contrário de comunidade, rede é feita e mantida viva por duas atividades diferentes. Uma é conectar, a outra é desconectar. Eu acho que a atratividade do novo tipo de amizade, o tipo de amizade do facebook, está exatamente aí. Que é tão fácil de desconectar.É fácil conectar, fazer amigos. Mas, a maior atratividade é a facilidade de se desconectar. Imagine que o que você tem não são amigos on line, conexões on line, compartilhamento on line, mas conexões off line.

Conexões de verdade, frente a frente, corpo a corpo, olho no olho, romper estas relações é sempre um evento muito traumático. Você tem que encontrar desculpas, tem que explicar, tem que mentir com freqüência, mesmo assim você não não se swente seguro, porque seu parceiro diz que você não tem direitos, que você é um porco etc.

É difícil, mas na Internet sempre é mais fácil, você só pressiona, deleta e pronto. Em vez de 500 amigos você terá 499. Mas isso será apenas temporário porque amanhã você terá outros 500.

E isso mina os laços humanos. Os laços humanos são uma mistura de benção e maldição.

Benção, porque é realmente muito prazeroso, muito satisfatório ter um outro parceiro em quem confiar e fazer algo por ele ou ela. É um certo tipo de experiência indispensável, indisponível para a amizade do facebook. Então é uma bênção.

E acho que muitos jovens não tem nem mesmo consciência do que perderam, mporque eles nunca vivenciaram esse tipo de situação.

Por outro lado é uma maldição, pois, quando você entra no laço, você espera ficar lá para sempre. Você jura. Você faz um juramento até que a morte nos separe.

O que isso significa?

Significa que você emprenha o seu futuro. Talvez amanhã, ou no mês que vem haja novas oportunidades, você não conseguiu prevê-las e você não será capaz de pegar essas oportunidades, porque você ficará preso aos seus compromissos anteriores, às suas antigas obrigações. Então, é uma situação ambivalente e, consequentemente, um fenômeno muito curioso, dessa pessoa solitária, numa multidão de solitários. Estamos todos numa solidão e numa multidão ao mesmo tempo.

Sei que há dois valores essenciais, absolutamente essenciais para uma vida satisfatória, recompensadora e relativamente feliz:

Um, é a segurança e o outro é a liberdade. Você não consegue ser feliz, ter uma vida digna, na ausência de um deles. Segurança, sem liberdade, é escravidão.Liberdade, sem segurança é um completo caos, incapacidade de fazer nada, planejar nada, nem mesmo sonhar com isso. Você precisa dos dois. O problema é que ninguém ainda na história e no planeta encontrou a fórmula de ouro, a mistura perfeita de segurança e liberdade.

Cada vez que você tem mais segurança, você entrega um pouco de sua liberdade. Não há outra maneira.

Cada vez que você tem mais liberdade você entrega parte de sua segurança. Voce ganha algo e você perde algo.

Há 81 anos, Freud publicou um livro famoso e tremendamente profundo e influente intitulado “O mal-estar da civilização”. Ele disse que a civilização é sempre uma troca, ou seja, você dá algo de um valor e recebe algo de outro valor. E ele escreveu isso em 1920. Naquela época ele disse que o problema deles, da velha geração, foi que eles entregaram liberdade demais em prol da segurança.

Eu estou profundamente convencido de que se Freud estivesse dando essa entrevista aqui, ele provavelmente repetiria que toda civilização é uma troca, mas o seu diagnóstico seria exatamente o oposto, que nossos problemas hoje derivam do fato de que nós entregamos demais a segurança em prol da liberdade.





Comments: Postar um comentário



<< Home

This page is powered by Blogger. Isn't yours?