25 de setembro de 2007

 

Fundação Palmares investiga, desmente TV Bahia/Rede Globo e reconhece quilombolas de São Francisco do Paraguassu

A TV Bahia entrou na linha do jornalismo-hipótese do novo teórico da comunicação Ali Khamel. Para ele, a mídia não deve fazer jornalismo e sim testar “hipóteses”. Em 14 maio, uma equipe da TV Bahia esteve em São Francisco do Paraguassu, distrito de Cachoeira, para testar mais uma hipótese. A reportagem concluiu que São Francisco do Paraguasu, uma das onze comunidades do Recôncavo Baiano reconhecidas como remanescentes de quilombos, era uma fraude. O Jornal Nacional veiculou duas reportagens intituladas “Suspeitas de fraude em área que vai ser reconhecida como quilombola” e “ Incra promete apurar denúncias de fraude no Recôncavo Baiano”. Nas duas matérias a emissora apresentava supostos indícios de uma fraude que estaria levando ao reconhecimento das terras.

O jornalismo-hipótese deu errado.

O presidente da Fundação Palmares, o baiano Zulu Araújo, divulgou (24/09/07) o resultado da sindicância que investigou as supostas fraudes no processo de registro do auto-reconhecimento de comunidades quilombolas. A investigação interna tinha sido motivada pela estranha reportagem da TV Bahia, transmitida no Jornal Nacional. A Comissão de Sindicância trabalhou 45 dias, conversou com autoridades, funcionários da Fundação Palmares, moradores da comunidade local e revisou o laudo antropológico. Não houve fraude. A TV Bahia mentiu, inventou, testou uma “hipótese” na linha teórica do jornalismo da Globo e afiliadas.

Agora, a Fundação Palmares trabalha com outra hipótese. A suspeita de que a “reportagem” da TV Bahia lançou suspeita sobre o processo de reconhecimento dos quilombolas de São Francisco do Paraguassu atendendo interesses nada antropológicos de fazendeiros latifundiários que se dizem proprietários das terras. É a velha luta de classe. Os proprietários brancos se socorrem da TV de gente branca e rica para impedir que os negros tomem posse das terras. À época, a comunidade divulgou abaixo-assinado de protesto pela reportagem considerada “fraudulenta e tendenciosa, sem oferecer à comunidade nenhuma oportunidade para se defender”.

Este blog BAHIA DE FATO protestou junto.

A reportagem foi tão estúpida que negou a existência de vestígios de engenhos de cana-de-açucar na região. Os jornalistas não fizeram o dever-de-casa do jornalismo.

A região do Recôncavo Baiano foi ocupada por escravos que trabalharam nos canaviais plantados desde o século XVI e na construção do Convento de Santo Antônio, concluído no final do século XVII, em cujo interior está enterrada uma família de portugueses, senhores das usinas de cana Cotinga e do Engenho da Peninha. A área onde foi construído o convento corresponde a duas sesmarias de terra e foi doada aos padres franciscanos pela família proprietária do engenho. Durante a construção do convento, muitos negros que teriam fugido do trabalho árduo e se refugiado na mata iniciaram o processo de formação do quilombo.

A “reportagem” TV Bahia/Rede Globo/Jornal Nacional afirmou que engenhos de açúcar nunca existiram na região, ignorando (só pode ser de propósito) o fato de que uma das áreas pleiteadas pertence a uma das primeiras fazendas de exportação de açúcar para a Europa, onde existiu um engenho muito importante, cujas ruínas podem ser observadas até hoje, conforme explicou pacientemente a antropóloga Camila Dutervil, que pesquisou a comunidade remanescente quilombola de São Francisco do Paraguassu.

O que mais se ouve no Paraguassu é "Abaixo a Rede Globo"!

Comments:
Olá, Oldack!

Enviei esta matéria para Luciana Mota, grande companheira e atual coordenadora do escritório da Fundação Palmares no Estado da Bahia.

Eis o que ela respondeu.

Saudações feministas,
Maria Alice Bittencourt.
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Olá Alice!
Obrigada pelo envio da reportagem do Blog Bahia de Fato.
Segue mais informações do site da Palmares, obrigada! Orgulho-me do seu profissionalismo.
Um forte abraço,
Luciana Mota
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QUILOMBOLAS: Audiência pública encaminha ações pela defesa do Decreto 4.887
(25/09/2007 - 18:29)

Brasília, 25/9/07 - Após seis horas e meia de debates, centenas de quilombolas - a estimativa é que eram mais de 500 - de todas as regiões do Brasil, a audiência pública promovida pela 6ª Câmara de Coordenação e Revisão do Ministério Público Federal foi considerada um sucesso por quilombolas e também por representantes de órgãos públicos federais. O principal tema da audiência, coordenada pela subprocuradora-geral da República, Deborah Macedo Duprat de Britto Pereira, foi a discussão em torno do Decreto nº 4.887/03, que regulamenta a identificação, o reconhecimento, a demarcação e a titulação das terras ocupadas por remanescentes das comunidades de quilombos. O auditório Nereu Ramos, da Câmara dos Deputados, foi pequeno para abrigar a tantas manifestações de apoio ao decreto e também exigência de explicações acerca das titulações. Alguns encaminhamentos foram aprovados. Entre eles, o pedido de uma audiência com o presidente Luís Inácio Lula da Silva.
Em comum acordo com o movimento quilombola, ficou acordado também entre os dirigentes presentes à audiência - o presidente da Fundação Cultural Palmares, Zulu Araújo participou do evento - que as discussões acerca da manutenção do Decreto 4.887 e também ações de titulação de comunidades quilombolas serão ampliadas nos estados. Outro ponto frisado no evento veio por parte do Movimento Quilombola, o qual enviará uma moção ao Supremo Tribunal Federal contrária a Ação Direta de Inconstitucionalidade que tramita na pauta contra o 4.887. Para a Secretaria Especial de Políticas de Promoção da Igualdade Racial (Seppir) ficou a tarefa de promover, como mais uma iniciativa do Programa Brasil Quilombola, o levantamento de todos os municípios que recebem recursos destinados a pastas sociais, a fim de garantir o aporte de verbas para ações junto às comunidades. Para a Advocacia Geral da União (AGU) ficou também a determinação de criar comissões de mediação de conflitos entre órgãos governamentais no que diz respeito a aplicabilidade do decreto. Também foi encaminhado ao Ministério do Meio-Ambiente informar ao Ministério Público Federal todas as áreas e comunidades quilombolas que serão atingidas por ações do Programa de Aceleração do Crescimento, o PAC.
A oportunidade de vir a Brasília e dar seu apoio a defesa dos direitos da população quilombola foi marcante para o trabalhador rural Arielson da Silva Neto. Morador da Comunidade Quilombola do Araçá-Volta, localizada 16 km de Bom Jesus da Lapa, BA, lutar pela defesa da terra também é brigar pela manutenção de uma cultura que lhe foi passada por seus avós e seus pais. "Temos medo de este decreto ser revogado e assim não termos direito a nossas terras. Estamos aqui para brigar por nossa área", disse Arielson, morador de uma comunidade que integra 144 famílias em seu território. Para Ivaldo Silva Souza, segundo coordenador da Aconeruq, do Maranhão, o governo é sim chamado a se unir favoravelmente a uma batalha que se estende desde a abolição da escravatura, pois o negro ganhou a liberdade e não ganhou o acesso à terra.

Reportagem: Oscar Henrique Cardoso, ACS/FCP/MinC
 
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