23 de outubro de 2006

 

Luiz Felipe de Alencastro explica porque vota em Lula

O historiador brasileiro Luiz Felipe de Alencastro é profesor na Universidade de Paris. No primeiro turno votou em Lula. E vai votar novamente no segundo turno. Ele acredita que o PT e Lula são portadores de um projeto democrático de transformação social. Ele não poupa o candidato do PSDB de críticas e acha que Geraldo chegou ao segundo turno por causa das manobras delituosas de membros do PT. Mas, afirma ver no comportamento de Geraldo Alckmin "a habitual arrogância tucana", ao não apresentar um programa claro de governo, por considerar que "basta repetir que a esquerda é burra e, ainda por cima, desonesta". Para o historiador, Alckmin apresentou nesta campanha "uma imagem de farmacêutico do interior num filme de Mazzaropi". Para o historiador, os objetivos do PT e de Lula devem ser os mesmos de toda esquerda democrática: transformar a maioria social do país em maioria política.

A seguir, trechos da entrevista para Rafael Cariello, na Folha de S. Paulo.

FOLHA - Em quem o sr. votou?

LUIZ FELIPE DE ALENCASTRO - Votei em Lula, como nas eleições precedentes em que ele se candidatou. Penso que o PT e Lula são portadores de um projeto democrático de transformação social que foi parcialmente realizado no primeiro mandato e poderá ser completado num segundo mandato. Votarei novamente em Lula no dia 29 de outubro. Mas, agora, com um pé atrás. Os erros de Lula e os atos delituosos da direção do PT suscitam reflexões pessimistas. Mas o impulso para o progresso social e a confiança no processo democrático, explicitados no voto majoritário que Lula obteve entre as camadas populares e a população negra, geram o otimismo da vontade de mudança.

FOLHA - O que achou do resultado do primeiro turno?

ALENCASTRO - Consolidaram-se duas mudanças positivas: o sistema de dois turnos, garantia de resultados não sujeitos à contestação, e o instituto da reeleição. Quebrou-se um tabu: o presidente candidato à reeleição não é imbatível. Lula levou uma fubecada e foi empurrado para o segundo turno. As sondagens mostram que 66% do eleitorado acha isso bom. O eleitorado aprendeu a manejar os dois turnos e quer mais explicações. Lula deve estar preparado para explicar o mensalão e o "dossiegate". Mas Alckmin talvez seja levado a formular os esclarecimentos que FHC não deu sobre as privatizações e a compra de votos para a emenda da reeleição.

FOLHA - O que lhe parece a candidatura Alckmin?

ALENCASTRO - Alckmin só chegou no segundo turno por causa das manobras calamitosas e suicidas do PT. No seu comportamento há a habitual arrogância tucana: não é preciso detalhar um programa de governo -procedimento essencial para todo postulante sério à Presidência-, basta repetir que a esquerda é burra e, ainda por cima, desonesta.

FOLHA - É possível explicar como um candidato constantemente apresentado como antipopular chega a angariar 40% dos votos?

ALENCASTRO - Alckmin representa um arco de alianças partidárias cujo potencial pode abarcar mais da metade do eleitorado brasileiro. Sua representatividade partidária é real. Mas foi ele próprio que forjou sua imagem de ator secundário da política brasileira. Foi ele que se projetou como um político de reserva, eterno vice-governador. Alckmin também aparece como um político provinciano que jamais se preocupou -ao contrário de Lula, FHC ou Serra- em estabelecer contato com lideranças políticas estrangeiras. Com a forte inserção do Brasil na diplomacia e no comércio internacionais, isso é uma lacuna grave. Ele é despreparado neste terreno e já deu vexame numa entrevista a um canal de TV australiano, fugindo de suas responsabilidades no governo de São Paulo. Sua propaganda eleitoral, mostrando a casinha de Pindamonhangaba, pagou o mico. Instalou uma imagem de farmacêutico do interior num filme de Mazzaropi. No debate da Bandeirantes, ele tentou consertar, falando grosso e grosseiramente. Gerou um conflito de imagens que provocou sua queda nas sondagens.

FOLHA - Lula opôs constantemente, no primeiro turno, o "povo" e a "elite". Faz sentido o discurso?

ALENCASTRO - Faz todo o sentido. Afinal o que se está querendo neste país? Que os evangélicos e a polícia resolvam os problemas gerados pela miséria e as desigualdades? É fundamental que essas opções sejam assumidas por um partido inserido no jogo democrático, por um presidente respeitador das instituições. A idéia de conflito de interesses é fundamental no funcionamento da democracia. Por minha parte, sempre achei que os objetivos do PT e de Lula devem ser os mesmos de toda esquerda democrática: transformar a maioria social do país em maioria política.

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